Segala Advocacia | NOVIDADES

NOVIDADES


27/01/2017
ESTABILIDADE NO EMPREGO E A POLÊMICA DA SÚMULA 42 DO TRT-17

No dia 23/01/2017, o Tribunal Regional do Trabalho do Espírito Santo publicou a seguinte Súmula:

 

INCONSTITUCIONALIDADE DO DECRETO 2.100/96. DENÚNCIA UNILATERIAL DA CONVENÇÃO 158 DA OIT. A Convenção 158 da OIT é um tratado de direito humano social. A aprovação e ratificação de um tratado de direitos humanos é um ato complexo, necessitando da conjugação da vontade de dois Poderes (Legislativo e Executivo), em claro respeito ao princípio da separação dos poderes previsto no artigo 2º da CR/88, bem como ao sistema de freios e contrapesos (checks and balances) consagrado na forma republicana de governo. Logo, a denúncia unilateral pelo Presidente da República (por meio de decreto) da Convenção 158 ratificada pelo Congresso Nacional é formalmente inconstitucional, por violação ao procedimento previsto no art. 49, I, da CF

 

Em outras palavras, o Tribunal capixaba consolidou entendimento de que a Convenção 158 da OIT é válida no país, pois não poderia ter sido denunciada (que é o termo utilizado para a sua revogação) por um ato único do então Presidente Fernando Henrique Cardoso.

A primeira consequência é que, declarando que a Convenção 158 da OIT é válida no país, estar-se-ia reconhecendo o direito dos trabalhadores a terem estabilidade no emprego, ou seja, a despedida somente poderia ocorrer mediante justo motivo, pondo fim a demissão sem justa causa, conforme preza o artigo 4º da Convenção:

 

Art. 4 — Não se dará término à relação de trabalho de um trabalhador a menos que exista para isso uma causa justificada relacionada com sua capacidade ou seu comportamento ou baseada nas necessidades de funcionamento da empresa, estabelecimento ou serviço.


No mundo jurídico, as opiniões a respeito da Súmula foram as mais variadas.

O ministro do STF, Gilmar Mendes, acusou a conduta do TRT-17 como irresponsável, aduzindo que há intervenção estatal na atividade privada, eis que o motivo da demissão teria que ser submetido à análise da Justiça do Trabalho.

 

Art. 7 — Não deverá ser terminada a relação de trabalho de um trabalhador por motivo relacionados com seu comportamento ou seu desempenho antes de se dar ao mesmo a possibilidade de se defender das acusações feitas contra ele, a menos que não seja possível pedir ao empregador, razoavelmente, que lhe conceda essa possibilidade.

Art. 8 — 1. O trabalhador que considerar injustificado o término de sua relação de trabalho terá o direito de recorrer contra o mesmo perante um organismo neutro, como, por exemplo, um tribunal, um tribunal do trabalho, uma junta de arbitragem ou um árbitro.

2. Se uma autoridade competente tiver autorizado o término, a aplicação do parágrafo 1 do presente artigo poderá variar em conformidade com a legislação e a prática nacionais.

3. Poder-se-á considerar que o trabalhador renunciou a seu direito de recorrer contra o término de sua relação de trabalho se não tiver exercido tal direito dentro de um prazo razoável após o término.

Art. 9 — 1. Os organismos mencionados no artigo 8º da presente Convenção estarão habilitados para examinarem as causa alegadas para justificar o término da relação de trabalho e todas as demais circunstâncias relacionadas com o caso e para se pronunciar sobre o término serou não justificado

 

Já, a frente dos juristas que defendem a aplicação da Convenção 158, como o ministro do Tribunal Superior do Trabalho, Lélio Bentes, justificam que a sua vigência é uma questão de civilidade, reduzindo um pouco o desequilíbrio existente entre empregado e empregador, permitindo que o trabalhador programe melhor sua vida, diante da estabilidade no emprego.

Dos 36 países que ratificaram a Convenção, somente o Brasil a denunciou (cancelou). Dentre eles, estão a França, Austrália e Espanha, onde não se vislumbra ter ocorrido a intervenção estatal tão temida pelos críticos.

Diante de tantos ataques, o TRT-17 publicou nota de esclarecimento sobre a Súmula 42, que reproduzimos na íntegra:

 

A propósito das notícias veiculadas na imprensa sobre a edição da Súmula 42 do Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região, em que se firmou entendimento de que a denúncia unilateral da Convenção 158 da OIT, por meio de decreto presidencial (Decreto 2.100/96), fere o procedimento previsto no artigo 49, I, da CF, e, portanto, é formalmente inconstitucional, cabem os seguintes esclarecimentos:

I.           Todos os tribunais do país detêm competência para declarar a inconstitucionalidade de norma e têm o dever de fazê-lo, quando provocados em casos concretos, sob pena de incidirem em negativa de prestação jurisdicional;

II.          A Edição de Súmulas pelos tribunais está prevista no ordenamento jurídico e sempre preconizada, com o intuito de uniformizar jurisprudência e conferir segurança jurídica aos jurisdicionados;

III.        As críticas ao conteúdo da Súmula 42 são incompreensíveis, uma vez que no Excelso Supremo Tribunal Federal o julgamento dessa mesma matéria, ainda não finalizado, encontra-se com placar majoritário (4X2) no mesmo sentido da Súmula local;

IV.        Por fim, a Súmula 42 diz respeito tão somente à inconstitucionalidade formal do Decreto 2.100/96, sendo que, quanto à interpretação do mérito da convenção e à sua adequação à ordem jurídica, o Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região, nos autos do processo 0000570-31.2016.5.17.0000, em sessão plenária a ser pautada brevemente, promoverá a modulação dos efeitos concretos dessa declaração.

 

Como destacou o Tribunal Regional, é incompreensível a balbúrdia acerca da súmula, quando o posicionamento do STF (ainda não finalizado) se dá no mesmo sentido.

O Ministro Bentes afirma que “o que se verifica é que se a justificativa da empresa é dificuldade econômica ou corte uma área para investir em outra, ela é aceita. Esse tipo de recurso só é utilizado em casos de demissão desmotivada, por vingança ou perseguição. Sei que de 80% a 90% das demissões são justificáveis, ninguém quer demitir. A norma é razoável, bem vinda e onde foi adotada não causou polêmica ou enormes mudanças para as empresas”.

Parece-nos que haverá novamente espaço para as Juntas de Arbitragem e, ao invés de criticar a vigência de uma Convenção que foi ratificada mediante discussão na Câmara e no Senado (sendo no mínimo questionável o seu cancelamento prematuro), há necessidade de o mundo jurídico pensar em soluções práticas para a efetividade prática e equilibrada da norma, o que poderá resultar, inclusive, na redução do número de ações trabalhistas.


Galeria de fotos

topo voltar